domingo, 13 de dezembro de 2009

Era uma vez...


Desde que iniciei este blog pensei sobre qual seria o momento ideal para publicar a história a seguir. Acho que ele finalmente chegou, pois além de considerar a passagem do ano um momento de renovação, hoje 27/12/2009, minha filha, Maria João, completa seu 1º aninho.
Mas antes de ir para o texto preciso dar um pequena explicação: logo após a morte de João, meu primeiro filho, e ainda por muito tempo depois, eu tinha muita dificuldade em dizer "morreu". Sempre tentei encontrar uma outra palavra ou expressão que representasse melhor o que a morte significava para mim. Não encontrei. Pelo menos não numa palavra, ou apenas numa expressão...
Tentei "partiu" ou "se foi", mas me pareceu completamente absurdo se ele está sempre aqui comigo... Perdi?! Como assim? Se eu sei exatamente onde encontrá-lo... "Voltou para casa", é verdade para muitos, mas não se encaixa perfeitamente na minha verdade. Não gosto da idéia de que a casa dele não pudesse ser aqui, fisicamente, junto a mim.
Acabei chegando a conclusão de que a melhor palavra é "morreu" mesmo, pois esta terá um significado diferente para cada pessoa ou, no meu modo de ver, para cada situação. Para mim "cada morte" terá sempre um significado diferente... Por isso não sei definir o que é a morte, mas sei, dizer, exatamente, através de uma "historinha meio prosa, meio verso" o que é a morte de João para mim.
Não acredito - e também não espero - que esta hitória que escrevi em 24/08/2009, faça sentido para mais ninguém. Mas para mim ela é a maior de todas as verdades, pois aprendi que a "VERDADE", "A GRANDE VERDADE", aquela que buscamos desesperadamente, é simplesmente aquela que consola nosso coração, que nos trás paz, que nos mantém bem conosco e com o mundo a nossa volta... Pelo menos esta é a MINHA verdade...

De: Mariana Para: João e Maria João ou talvez seja para mim mesmo...

Era uma vez uma menina. Mariana era o seu nome. A menina Mariana cresceu, mas continuou menina. Um dia, a menina Mariana conheceu um rapaz. O rapaz fez-se companheiro e conquistou seu coração. Eles se apaixonaram e desse amor nasceu João. Mas João não era um menino comum. Era na verdade um raio de sol que um dia, talvez por curiosidade, ou talvez por necessidade, tomou de um corpo e virou João.
João chegou numa manhã de sábado, e chegou deixando claro que não iria ficar aqui por muito tempo não. A Menina Mariana se assustou, ficou confusa e chorou. Ela queria que o menino João, sendo raio de sol ou não, ficasse por aqui um tempão. Mas ele era raio de sol... E é impossível segurar luz com a mão...
O menino João tinha um coração frágil, fraco, mas o Raio de sol era forte, guerreiro e encantador, seu sorriso era pura luz capaz de espantar qualquer escuridão.
E a Menina Mariana o amava e cuidava dele e era ela toda dedicação. A luz de João era tão forte que aquecia e agigantava o coração da Menina Mariana, que embora se recusasse a crescer, acabou por obter força e coragem para ver o novo mundo que o Raio de sol lhe levou a conhecer. Era um mundo mais duro, mais difícil, cheio de dor, ansiedade e confusão, mas também era um novo mundo de amor, de puro amor, em meio a tanta ilusão. Sim, foram tempos difíceis, hospital, agulhas, remédios, noites sem dormir. Medo de tudo, medo do dia seguinte, medo de não ver mais o menino João... Mas, também, foram tempos de aprendizado, fortalecimento e construção. Construção de um amor verdadeiro, incondicional, repleto de alegria; pois quando João sorria o mundo se iluminava e ficava tudo fácil então. Foi só com João que a Menina Mariana aprendeu o verdadeiro significado de palavras tão comuns e corriqueiras, como família, amigos, apoio, solidariedade e compaixão.
E a Menina Mariana finalmente cresceu sob a luz intensa do menino Raio de sol João e Mariana não era mais menina, era Mulher, era Mãe, era enfim Compreensão.
E foi chegado o dia, o dia que o menino Raio de Sol partiria deixando somente saudade em seu coração. Os médicos em vão tentaram, por horas a fio se esforçaram, mas como conter luz tão intensa, como manter dentro de um corpo tão frágil tanta sabedoria, tanto amor e tanta paixão, pois a medida que o corpo do menino João crescia sob o amor de sua mãe, a luz de Raio de sol crescia cada vez mais e sempre em maior proporção. Sua luz era agora mais forte e brilhante e tinha necessidade imensa de se expandir e brilhar em toda direção.
Antes de ir pediu um beijo a sua Mãe Mulher Mariana e neste beijo acendeu a luz que ele havia plantando naqueles três anos e meio no seu coração. A mãe mulher Mariana na hora não percebeu que a luz se acendeu, tal era seu medo, pavor e apreensão. Mas, enquanto os médicos tentavam a mãe mulher Mariana, ainda que com medo e assustada, sentindo tamanho aperto em seu coração, foi inspirada em oração; e com certeza não sozinha estava quando com bravura e compreensão entregou o Raio de sol de volta ao Pai Maior esperando que assim tivesse fim a total escuridão.
Então veio a notícia. O Raio de sol partira levando o pequeno grande João. E neste momento a luz se apagou, fez-se o pranto, a dor e novamente a incompreensão. A mãe mulher Mariana esqueceu-se da promessa e de toda decisão, novamente virou menina e embora não parecesse, pois chorava brandamente, xingou, se desesperou e desejou que a terra se abrisse e dela saísse todo mal e podridão e que engolisse a tudo e a todos, tal era o seu ódio e sua decepção. E ficou neste estado, de desespero calado, até a total exaustão. E daí por diante tudo era nuvem e confusão, vôo de volta para casa, velório, enterro, multidão...
Mas o amor da família, pais, amigos, do rapaz companheiro e dos irmãos conseguiu pouco a pouco reacender a luz plantada por João. E o Pai Criador junto com o Raio de sol João a perdoou por serem puro amor e pura compreensão, pois entendem toda dor de uma mãe quando não mais pode ver seu filho com o sentido da visão.
A mãe mulher Mariana seguia sua vida ao lado do seu rapaz companheiro. Eram felizes, é verdade, apesar de toda saudade que havia em seus corações. De vez em quando ainda choravam e claro sentiam muita falta do pequeno grande João. Mas o tempo acalma tudo e embora a saudade, tinham certeza, nunca deixaria seus corações, eles conseguiam viver a vida sem maior complicação.
Mas a mulher Mariana se esforçava para ser apenas, esposa, filha, tia, amiga, profissional, irmã. Não que não fosse mãe, claro que era, mas sentia falta de ser chamada por este nome, sentia falta de barulho de criança, choro, pedido de colo, reclamação.
Foi então que o Raio de sol João teve uma idéia e segredou ao Criador sua nova invenção: que tal mandar para mãe mulher Mariana a flor mais linda do jardim da redenção? E o Pai Criador feliz e orgulhoso da bondade de seu filho João concordou imediatamente e tomou a decisão: manda Maria olhos de céu. Ela será pura diversão...
E assim foi. A mulher mãe mariana encheu seu ventre novamente de esperança e resolução e recebeu em seus braços a flor mais linda do jardim de João...
Desde o início ela sabia que era uma menina linda que estava se formando então, pois em um sonho o Raio de sol lhe sussurrou: Mãe, é Maria esta menina, a flor mais perfumada do meu jardim de irmãos... E então esse é o nome da menina que virá. Maria de João, Maria João para o nosso coração alegrar. Nome estranho, disseram alguns, mas como poderia então mudar, se é Maria de João, não há como negar.
E então ela chegou linda e perfumada, uma flor. Seus olhos são duas contas, olhos de céu, devo falar e seu sorriso é uma festa que só Raio de sol soube engendrar.
E Mãe Mulher Mariana traz aceso em seu coração, a luz plantada pelo Raio de sol João e quando esta luz, por algum motivo, pensa em se apagar Maria João a acende com apenas um olhar.
Então é esta a história de Mariana. Menina que recebeu um Raio de sol e virou Mãe mulher.
Mãe de Maria. Mãe de João.

De: Mariana Para: Minha família

Temos uma tradição de família que já dura pouco mais de 20 anos. Todo segundo sábado do mês de dezembro nos reunimos em um grande almoço onde estão presentes os filhos, netos, bisnetos, trinetos e mais recentemente até os tataranetos dos pais de minha mãe. Amo estes encontros. São momentos de alegria, renovação e, inevitavelmente, tristezas também... No ano de 2006, em 14 de novembro, João, meu primeiro filho, morreu com 3 anos e meio de idade depois de 10h de cirurgia e uma noite inteira de idas e vindas até o desenlace final...
Foi para este encontro, em 2006, que escrevi o texto a seguir.
Tenho que fazer uma ressalva: neste texto roubei palavras de uma grande AMIGA, Alba Querino. Pouco tempo depois da morte de meu pequeno grande João, ela me presenteou um texto lindo, poético, consolador, uma benção... - prometo postá-lo na intégra em outra oportunidade. Eram palavras tão perfeitas para o meu momento que foi inevitável usá-las....

De: Mariana Para: Minha família

Quero agradecer a Deus por ter nascido nesta família. Nesta família que me ensinou o verdadeiro sentido da vida.
Graças aos ensinamentos desta família eu pude ter a benção de receber sob os meus cuidados o pequeno grande João. Um espírito iluminado que fez parte da minha vida por muito pouco tempo, mas que ficará comigo para sempre...
Se eu não soubesse das verdades que aqui aprendi, eu não poderia ter sido instrumento da vontade do Pai Maior em ajudar João no resgate que ele aqui realizou.
Nestes três anos que João esteve aqui vivi na prática muitos destes ensinamentos. Exercitei o amor sem apego todos os dias e acredito que este é o "grande aprendizado" de nossa vidas. Pois o apego é, para mim, a causa de todo sofrimento humano. Alguém pode dizer, então, que para não sofrer basta apenas não se envolver, não cativar, não cuidar, não amar... Mas sem amor não há felicidade...
Exercitar o amor sem apego foi tudo que fiz nestes três anos... E espero que eu saiba aproveitar esta oportunidade que me foi dada e continue este exercício.
Quero dizer a estas pessoas - que amo muito e que sei que me amam também - que não se preocupem comigo eu tenho o consolo do dever cumprido, de ter dito sim ao amor. E se as vezes estou triste, muito triste... É só saudade...

Como escreveu uma grande amiga:
“...A vida e a morte são amigas, companheiras, ainda que a gente não entenda. Ainda que doa em nosso coração simples. Mas dentro da nossa dor encontramos a Força. Ás vezes, até a nossa paz, paz do dever cumprido, do amor carinhosamente dado, de poder dizer sim à Vida, numa tarefa, missão, algumas vezes árdua. Mas o Mistério nos permite isso: dizer Sim, sem muitas vezes sequer compreender o sentido. Ser instrumentos de uma sinfonia maior. Nós somos muitas vezes a ponte, apenas a ponte para uma expressão da Vida que o espírito anseia completar. E o pequeno ensina ao grande..."

Alguns agradecimentos especiais:
A minha mãe: que tem o poder de consolar o meu coração
A meu pai: o equilíbrio e a segurança de que nunca estou só
A minhas irmãs: amigas eternas, cúmplices. Para elas praticamente não existem segredos
A meus sobrinhos: que são para mim alegria e esperança
E um agradecimento, me perdoem os demais, ainda mais especial
a Marcus: fonte de força, coragem, vontade de viver. Companheiro desta e de tantas outras batalhas já travadas e que ainda iremos travar...
E o maior de todos agradecimentos a Deus que me permitiu ter todos estes espíritos ao meu redor...

O Natal ou De: Bianca Para: sua família


Para esta época do ano escolhi dois textos. O primeiro é meu mesmo, escrito no Natal de 2006. O segundo foi escrito por minha sobrinha, Bianca, a filha mais velha de minha irmã Giovana, no Natal de 2008. Peço permissão, porém, para inverter a ordem cronológica e postar, primeiro, o texto de Bia. Porque? Porque primeiro prefiro que vocês entendam o que é o Natal na minha família, ou melhor, que tipo de família é a minha... e o texto de Bia é perfeito para isso. Creio que assim entenderão melhor o meu texto, escrito no Natal mais difícil, estranho e vazio da minha vida. Mas esta é uma outra história... que contarei mais tarde...
Bem, então a vamos ao "primeiro" texto. O de Bia, a menina dos meu olhos. Bianca é muita mais que minha sobrinha... Ela é - como diria Clarissa Pinkola Estés - a minha Khaleh "palavra iraniana com significado de uma intimidade familiar especial e carinhosa ou afinidade psíquica com outra alma. Almas afins que se comunicam muito além das palavras...". Bia escreveu este texto no primeiro Natal que passou longe de nós. Ela tinha, na época, apenas 16 anos e, pelo texto que poderão ler a seguir - e por outros tantos que ainda postarei neste blog - perceberão que ela é realmente especial...

De: Bia
Para: Sua família


"Para mim o Natal nunca significou muita coisa. No fundo, nunca relacionei essa data ao nascimento de Cristo, nem nunca parei pra pensar no sentido que esse dia tem para as pessoas.
Me acostumei com os presentes, os jantares… Em ter todo mundo reunido, em estar com a minha família. E, ter tudo isso, todo ano, me deixou tão mal acostumada que eu nunca parei pra pensar em como seria se, por algum motivo, eu não tivesse isso.
Eu me lembro de todas as mensagens, todas as orações natalinas, todos os discursos em que vocês –vó, vô, tias, tios – tentaram mostrar a importância dessa ocasião, o verdadeiro sentido do Natal e a sorte que a nossa família tem, que eu tenho, em poder se reunir nessa data.
Eu sempre dei muito valor a essas lições, sempre escutei com muito cuidado e realmente achei que entendia tudo isso. Eu achei que tinha aprendido, que compreendia o sentido do Natal, a importância de uma família unida.
Mas a verdade é que só agora, não estando aí com vocês, é que eu realmente entendo. Não é só o sentar ao lado de um conhecido e brindar “a um nascimento que aconteceu dois mil anos atrás". Não é só uma noite de festa e comilança. É a afirmacão constante dos laços que unem a nossa família. É a celebracão do amor que nos mantém unidos, que nos da força, que nos ilumina. O Natal é o nascimento de Cristo em cada um de nós e comemorar isso com quem a gente ama é o maior presente que podemos dar uns aos outros.
Ah, Familia Querida, o que eu tenho pra dizer é tão simples, e ainda assim, me faltam palavras… Me faltam frases, pontos, virgulas, pra descrever a eterna gratidão e o amor incondicional que eu tenho por cada um de vocês. Pra dizer o quanto cada membro dessa familia significa pra mim, pra traduzir o quanto penso em vocês, em TODOS vocês. O que posso fazer é me conformar com a minha falta de talento literário, me conformar em não ser Vinicius ou Chico ou Cecilia e dizer, sem mais floreios, o que quero que vocês saibam:
Eu estou longe de casa há quase cinco meses. Vivo com uma nova familia, e, quando é preciso, me mudo para casa de outra familia por alguns dias. Viajo constantemente com pessoas que conheci por poucas horas, encontro alguém diferente a cada passo que dou. E não teve um minuto, um momento sequer, que tive medo ou que me senti desconfortável.
Não é porque eu não sinta saudades ou seja corajosa. Eu me sinto em casa aqui, como tenho certeza que me sentiria em qualquer outro lugar. Eu me sinto em casa por que eu tenho cada um de vocês comigo a cada passo que eu dou. Eu sinto os laços tão fortes dessa família que eu amo, eu me sinto protegida, amada. Eu me pego agradecendo a Deus por cada dia, por cada membro que compõe essa corrente, essa muralha que me dá força.
Enfim, o que estou tentando falar é: Obrigada. Obrigada por estarem comigo sempre, obrigada pelo simples fato de existirem. Obrigada por todas as broncas, todos os sorrisos, todas as lições, todos os encontros. Obrigada por serem a minha família. E, é, claro:
Feliz Natal!"